Flores caras para o planeta
Pedro Santos
| 01-09-2025

· Equipe de Natureza
Você está fazendo compras, e lá estão elas: um buquê de rosas vermelhas perfeitas no meio de janeiro. Você para.
Talvez seja para o aniversário de alguém, talvez só para alegrar a mesa em uma semana escura. Elas são lindas — e surpreendentemente acessíveis.
Mas por trás dessas rosas de inverno está uma longa e invisível jornada: iluminação artificial, estufas aquecidas, voos longos e refrigerados, e caminhões que cruzam continentes para colocar as flores nas suas mãos.
Aquele buquê espontâneo de 15 dólares pode parecer uma alegria simples, mas o custo ambiental está longe de ser leve.
Vamos entender o que realmente é necessário para fazer flores desabrocharem fora da estação — e o que isso significa para quem se importa com sustentabilidade no dia a dia.
A verdadeira jornada das flores "frescas"
Flores, como a maioria das plantas, são sazonais. Tulipas florescem na primavera. Rosas adoram o começo do verão. Mas o comércio global de flores tornou possível ter qualquer flor, em qualquer época do ano.
Para isso, dois sistemas principais atuam nos bastidores:
Estufas e crescimento artificial
Para simular condições ideais de cultivo, muitas fazendas de flores dependem de ambientes aquecidos e controlados por luz.
Isso não é apenas uma janela ensolarada — é consumo industrial de energia. Lâmpadas de sódio de alta potência, sistemas de controle de temperatura e câmaras de enriquecimento de CO₂ contribuem para o aumento das emissões de carbono.
Transporte refrigerado
Depois de colhidas, as flores são resfriadas, embaladas e enviadas — muitas vezes por avião — para os principais mercados.
Para que não murchem, ficam refrigeradas em todas as etapas. Um único buquê de rosas enviado internacionalmente pode emitir cerca de 2 a 3 quilos de CO₂. Multiplique isso por milhões de buquês por ano, e o impacto cresce rápido.
Ironicamente, o item mais perecível do seu carrinho pode ser o que tem a maior história de viagem.
Por que as flores têm tanta pegada de carbono?
Enquanto a indústria alimentícia costuma receber a maior atenção nas conversas sobre sustentabilidade, a indústria das flores tem passado despercebida. Ela é pouco regulada em muitos países, não está coberta por normas de comércio justo ou de emissões, e é vendida como um luxo inofensivo.
Mas os números mostram outra realidade:
• Emissões do transporte aéreo: por quilômetro, o transporte aéreo libera 50 vezes mais CO₂ do que o transporte marítimo;
• Consumo de energia na refrigeração: manter as flores entre 1 e 2°C durante todo o transporte consome muita energia — às vezes mais do que o cultivo das flores em si;
• Resíduos de embalagem: plásticos, isopor e elásticos usados nas embalagens raramente são reciclados e frequentemente acabam em aterros;
Tudo isso por algo que geralmente dura menos de uma semana.
Então, qual é a alternativa?
Se importar com o planeta não significa abrir mão da beleza das flores. Mas pode significar repensar como — e quando — você as compra.
Aqui vão algumas formas de curtir a alegria das flores sem culpa:
Compre local e na estação
As flores mais sustentáveis são as cultivadas mais perto de você, na sua estação natural. Veja se sua região tem pequenas fazendas ou feiras de flores. Final de primavera e verão são geralmente as melhores épocas para flores locais.
Apoie os produtores de flores lentas
O movimento “slow flowers” promove flores sazonais, cultivadas de forma ética. Muitos desses produtores evitam pesticidas, minimizam o uso de energia e usam embalagens compostáveis. Alguns ainda oferecem assinaturas ou retiradas de buquês.
Cultive seu próprio jardim de corte
Se você tem um pequeno espaço no chão ou até vasos na varanda, pode cultivar flores como cosmos, zínias, calêndulas ou ervilhas-doce. Essas plantas fáceis de cuidar oferecem beleza constante — e zero pegada de transporte.
Repense os presentes
Se sua intenção é dar flores, considere uma planta em vaso, um buquê de flores secas ou até um sachê artesanal de ervas. Eles duram mais e carregam mais significado.
Por que isso importa além das flores
Flores fora de época não são um problema isolado — fazem parte de um padrão maior de desconexão entre conveniência do consumidor e custo ambiental.
Toda vez que escolhemos morangos em dezembro, moda rápida feita do outro lado do mundo, ou rosas no meio do inverno, participamos de um sistema baseado em superprodução, consumo exagerado e emissões invisíveis. Mas isso não é para gerar culpa. É para aumentar a consciência.
Quando entendemos o verdadeiro custo por trás de pequenos luxos, podemos fazer escolhas mais informadas — sem abrir mão do que torna a vida mais bonita.
Na próxima vez que você estiver na frente de uma floricultura ou navegando num aplicativo de entrega, pare e pergunte: isso precisa mesmo ser transportado do outro lado do mundo? Você pode até comprar o buquê.
Mas talvez prefira tulipas em abril ao invés de rosas em janeiro. Ou pergunte ao florista sobre flores locais. Ou comece um pequeno vaso de flores cultivadas em casa, ali na pia da cozinha. Pequenas mudanças assim não são só boas para o planeta — elas nos conectam mais aos ritmos da natureza. E, às vezes, essa atenção é o presente mais bonito de todos.